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quarta-feira, 28 de setembro de 2011

O QUE NOS PEDIRIA UM AUTISTA

1 - Ordem e estrutura, antecipando o que vai acontecer.

2 - Respeita o meu ritmo. O normal é que eu me desenvolva cada vez mais.

3 – Fale-me pouco e devagar. As palavras em demasia podem ser uma carga muito pesada para mim.

4 – Diga, de algum modo, quando consigo executar tarefas bem feitas, mesmo que nem sempre eu consiga. Necessito compartilhar o prazer e o gosto de fazer as coisas bem feitas.
5 - Necessito de mais ordem e mais previsibilidade no nosso convívio. Teremos que negociar os meus rituais para convivermos.

6 – Não permitas que me acomode e permaneça inativo, mesmo sendo difícil compreender o sentido de muitas das coisas que me pedem para fazer. Elas têm que ter um sentido concreto.

7 - Respeita as distâncias que necessito, porém sem me deixar só. As pessoas são, às vezes, demasiadamente imprevisíveis, ruidosas ou estimulantes.

8 - Quando eu me zango ou me golpeio, se destruo algo ou me movimento em excesso, quando me é difícil atender ou fazer o que me pede, não estou querendo te prejudicar. O que faço não é contra você. Não me atribuas más intenções!

9 - Meu desenvolvimento não é absurdo, embora não seja fácil de entender. Muitas das condutas são formas de enfrentar o mundo na minha especial forma de ser e perceber.

10- Meu mundo não é complexo e fechado. Pelo contrário, é aberto, sem dissimulações e mentiras, tão ingenuamente exposto aos demais, que é difícil penetrar nele.

11- Não me peças sempre as mesmas coisas nem me exijas as mesmas rotinas. O autista sou eu, não você!

12- Não sou só autista. Sou uma criança, um adolescente, ou um adulto. Compartilho muitas coisas das crianças, adolescentes ou adultos. É aquilo que compartilhamos que nos une.

13- Vale a pena viver comigo. Pode chegar um momento em sua vida em que eu, que sou autista, seja sua maior e melhor companhia.

14- Não me agridas quimicamente. Não preciso de medicamentos, apenas o acompanhamento periódico de um especialista.

15- Ninguém tem culpa de minhas reações e condutas difíceis de compreender. A idéia de "culpa" só produz sofrimentos.

16 - Ajuda-me a ter mais autonomia, mas peça só o que posso fazer.

17- Necessito estabilidade e bem estar emocional ao meu redor para estar melhor. Para mim, não é bom que estejas mal e deprimido.

18- Ajuda-me com naturalidade, sem obsessão. Aproxime-se de mim, porém, tenha seus momentos de repouso ou dedique a suas própria atividades.

19- Aceita-me como sou. Minha situação normalmente melhora, ainda que, no momento, não tenha cura.

20- Não compreendo as sutilezas sociais, porém tão pouco participo das duplas intenções ou dos sentimentos perigosos tão freqüentes na vida social. Minha vida pode ser satisfatória, se é simples, ordenada e tranqüila. Ser autista é um modo de ser, ainda que não seja o normal. Nessa vida, podemos encontrar-nos e compartilhar muitas experiências.

(Adaptação do texto de Angel Rivière, Autism-Spain - Assessor Técnico da APNA - Madrid, 1996.

domingo, 11 de setembro de 2011

Diagnóstico Precoce

Segue link com dois vídeos sobre autismo em bebês. Clique em

"Vídeo "Autismo em Bebês" para diagnóstico precoce do autismo''

Reportagem sobre o diagnóstico em bebês. Créditos à Revista Autismo [www.http://revistaautismo.com.br]

Todos juntos pelo autismo!

por Walter Camargos Júnior

Neste texto o autor, que tem trabalhado muito com o tema, é autor do vídeo “Autismo em Bebês” (www.fhemig.mg.gov.br/pt/publicacoes/campanhas-educativas) e escreve sobre possibilidades e necessidades. Essas informações só são válidas para os 60% a 70% das crianças autistas que nascem com sinais de autismo, já que o restante vai apresentar algum desenvolvimento normal e só depois apresentarão os sinais de autismo, conforme opinião de Eric Fombonne.

A afirmação do enunciado deste texto traz ao menos quatro perguntas:

1) quais são os sinais possíveis a serem vistos?

2) por que a maioria das suspeitas ocorrem após a idade de dois a três anos?

3) qual a importância dessa precocidade?

4) o que precisamos mudar?

1) Quais são os sinais possíveis de serem vistos?

É possível ver todos os sinais que ocorrem em crianças maiores, todos. Mas, evidentemente estes sinais estão adequados à idade do bebê. Por exemplo: como o bebê ainda não anda, não o veremos correndo e subindo em tudo, como vemos numa criança acima de dois anos, mas haverá a informação de que o bebê não dorme na quantidade esperada, chora muito, é cansativo, etc. Encontramos bebês que só ficam no colo, ou dormem em posições muito estranhas, ou se alimentam com determinados rituais, etc – isso é equivalente aos sintomas de manutenção de rotinas que encontramos na vida posterior.

Todos os bebês com desenvolvimento normal apresentam as mesmas características, que não são comuns nem constantes nos que têm autismo: alegria, curiosidade; prazer no contato físico com outros – o aconchego; busca pela “atenção” das outras pessoas; busca pelo olhar das outras pessoas; alternância alegria / irritação e acordado / dormindo. É importante ressaltar que essas características podem ocorrer, mas não são freqüentes nem constantes nos que tem autismo. Isso quer dizer que se alguns comportamentos normais existirem, podem não estar presentes na mesma quantidade que ocorre com o bebê sem autismo.

Após chamar a atenção do leitor que comportamentos normais podem também estar presentes mas numa quantidade muito menor, descreverei aqui algumas diferenças de qualidade de comportamentos existentes “facilmente” vistos nos bebês: olham menos para a mãe e outras pessoas, em todas as situações esperadas como nos momentos livres de contato puro e simples, na amamentação, nos momentos de higiene pessoal do bebê, etc.; há menos trocas comunicativas aos encontros com a mãe e outros e o olhar nos olhos como forma de comunicar é ausente ou rara, mesmo quando pede algo; não acompanham com o olhar a movimentação da mãe, mas o fazem com objetos; o aconchego físico pode ser rejeitado com a demonstração de sentir-se melhor no berço quando fica sozinho; pode não levantar os braços para ser retirado do berço; pode não demonstrar alegria com mudanças da mímica facial e corporal e nem emissão de sons às brincadeiras usuais de beijos, cócegas, música, etc. – a mímica não modifica de acordo com as situações que estão acontecendo; pode não demonstrar alegria ao ver a mãe / cuidador; pode não reagir à voz da mãe e de pessoas próximas, assim como a um barulho próximo; pode haver pouco sono noturno e diurno, e alterações na alimentação (muita ou não chorar para alimentar); a partir dos cinco meses não reage / responde ao nome – não se reconhece pelo som de seu nome (este sinal é o mais fácil de ser percebido por qualquer um); por volta de oito meses não aponta o que quer; por volta de um ano não aponta para partilhar interesses; há um atraso nas brincadeiras de esconde-esconde dessa idade (em Minas Gerais isso se chama de “pudi”); a fala geralmente não surge na quantidade esperada; pode haver movimentos de mãos e braços sem finalidade aparente, usualmente mãos na frente dos olhos; quando já anda, pega o outro pela mão e o leva para fazer algo – usa outros como ferramentas; quando fala, usa o terceiro pronome (ele) para se nomear, ao invés do primeiro (eu).

O questionário de triagem de nome M-CHAT, indicado para utilização aos 18 meses, que é de fácil uso, possui 23 itens, dos quais seis são os mais importantes, a saber: interessa-se pelas outras crianças; aponta para mostrar algo de seu interesse; alguma vez lhe trouxe objetos (brinquedos) para lhe mostrar; imita o adulto; responde/olha quando o(a) chamam pelo nome; se apontar para um brinquedo do outro lado da sala, a criança acompanha com o olhar.

Como se pode verificar já nessa idade, há sinais de prejuízo das três áreas (interação, comunicação e comportamentos) que formam os critérios clássicos de diagnóstico de autismo infantil – Classificação Internacional de Doenças e o Manual Diagnóstico Estatístico de Transtornos Mentais.

2) Porque a grande maioria das suspeitas ocorrem só após a idade de dois a três anos?

Porque ninguém quer ver problemas nos filhos; porque a falta de experiência prévia com uma criança de desenvolvimento normal impede a percepção de que a criança está tendo um atraso no desenvolvimento; e porque os médicos pediatras ou dos Programas de Saúde da Família não foram treinados a identificar esses atrasos nessa idade. Os pediatras dominam bem o desenvolvimento sensório motor, mas não os aspectos emocionais e cognitivos. Isso explica o porquê de eles identificarem facilmente um atraso na fala, mas não um atraso na comunicação (olhar, mudança da mímica numa brincadeira, apontar, não resposta ao nome, etc.) – eles só identificam atrasos instalados em sua plenitude.

3) Qual a importância da precocidade da suspeita do Autismo?

Porque quanto mais cedo é identificado um transtorno, mais rápido o curso normal do desenvolvimento pode ser retomado. Porém os resultados dependem não somente da identificação dos atrasos e da indicação dos tratamentos adequados e eficazes, mas da aceitação dessa condição diferenciada pelas famílias e pelo futuro de cada um, que não dominamos nem sabemos.

.O que eu e minha equipe temos presenciado é a incomparável velocidade na melhora clínica de crianças abaixo de quatro anos quando comparamos com aqueles que iniciam os tratamentos aos seis anos. Outra questão importante é a conclusão do autor Kleinman (2008) de que aproximadamente 90% das crianças diagnosticadas como autistas aos dois anos de idade, mantêm tal diagnóstico posteriormente.

4) O que precisamos mudar para realmente melhorar o futuro das crianças com autismo infantil?

Treinar os médicos; criar um cadastro estadual ou nacional para o Autismo Infantil, para ser possível a realização de pesquisas nacionais sobre o tema; instituir uma avaliação de triagem para autismo aos 18 meses através da Sociedade Brasileira de Pediatria e o Ministério da Saúde como já existe nos Estados Unidos; e instituir tratamento realmente especializado para essa população – que não quer dizer em aumentar as vagas de tratamentos focados em sintomas psicóticos e/ou antissociais, como é o atual padrão dos CAPPS-I existentes no País.

Concluindo, a suspeição da maioria dos quadros de autismo pode ser realizada já nos primeiros meses de vida na maioria das vezes e tais quadros são passíveis de melhoras clínicas significativas. O conhecimento na área do Autismo Infantil tem crescido muito em nosso País, mas muito caminho ainda há para ser percorrido se não esquecermos que os bebês com autismo são pessoas e cidadãos brasileiros como nós!

ANEXO

Modified Checklist for Autism in Toddlers (M-CHAT), Diana Robins, Deborah Fein & Marianne Barton, 1999. Resultados superiores a três falhas em no total ou em dois dos ítens considerados críticos (2,7,9,13,14,15), indicam uma avaliação por profissionais especializados.

  • Gosta de brincar ao colo fazendo de “cavalinho”, etc
  • Interessa-se pelas outras crianças
  • Gosta de subir objetos, como, por exemplo, cadeiras, mesas
  • Gosta de brincar de esconde-esconde
  • Brinca de faz-de-conta, por exemplo, falar ao telefone ou dar de comer a uma boneca, etc
  • Aponta com o indicador para pedir alguma coisa
  • Aponta com o indicador para mostrar interesse em alguma coisa
  • Brinca apropriadamente com brinquedos (carros ou Legos) sem levá-los à boca, abanar ou deitá-los ao chão
  • Alguma vez lhe trouxe objetos (brinquedos) para lhe mostrar
  • A criança mantém contato visual por mais de um ou dois segundos
  • É muito sensível aos ruídos (ex.: tapa os ouvidos)
  • Sorri como resposta às suas expressões faciais ou ao seu sorriso
  • Imita o adulto (ex.: faz uma careta e ela imita)
  • Responde/olha quando o(a) chamam pelo nome
  • Se apontar para um brinquedo do outro lado da sala, a criança acompanha com o olhar
  • Já anda
  • Olha para as coisas para as quais o adulto está olhando (acompanha o olhar do adulto como atenção compartilhada)
  • Faz movimentos estranhos com as mãos/dedos na frente do rosto
  • Tenta chamar a sua atenção para o que está fazendo
  • Alguma vez se preocupou quanto à sua audição
  • Compreende o que as pessoas lhe dizem
  • Por vezes fica a olhar para o vazio ou fica andando ao acaso pelos espaços
  • Procura a sua reação facial quando se vê confrontada com situações desconhecidas

Walter Camargos Jr. é médico, especialista em Psiquiatria da Infância e Adolescência no Hospital Infantil João Paulo II, Unidade FHEMIG, em Belo Horizonte (MG) e mestre em Ciências da Saúde pelo IPSEMG. Contato: (31) 3261-5976 e e-mail waltercamargos@uiavip.com.br